Do luto do desmame e a prisão da maternagem perfeita
Quando alívio e culpa se misturam
Passei por duas experiências distintas na amamentação dos meus dois filhos. Com o primeiro foi um começo difícil, nenhuma informação e só vontade. Com os tropeços e mais sorte do que juízo conseguimos engrenar a duras penas a amamentação. Foram dois anos muito bons e aproveitamos muito. Naquela época não tive contato com as cartilhas da “nova” maternagem, ou as teorias que agora embasam tantas mulheres mães na busca de uma maternagem mais apegada. Sempre segui o bom senso, a não-violência e aceitava algumas recomendações e palpites de médicos, mães, irmãs e o que mais achasse adequado para educação do meu filho.
Com o passar do tempo conheci a “nova” maternagem, conheci mães maravilhosas, grupos de apoio. Comecei a acompanhar blogs e grupos sobre cuidado e educação dentro desse universo do “apego”. Já mergulhada nesse mundo veio a Cecília, uma menina arteira, que me ensinou muito nesses 14 meses de vida. Com ela a amamentação correu bem, mas,diferente do meu primeiro filho, o desmame da caçula veio carregado do peso das obrigações da “maternidade humanizada”.
A escolha e o desejo de amamentar é da mulher. É o corpo dela que se encontra disponível, é ela quem doa o seu tempo para amamentar. Quem deve decidir quando esse ciclo deve encerrar? A mulher. Ela quem deve estabelecer o seu limite, não as teorias, cartilhas, o marido, ou o pediatra.
Ainda assim,desejar o desmame foi carregado pelo sentimento de fracasso por não conseguir prosseguir com a disposição total. Por perceber que sou humana e não consigo atingir as expectativas da “super mãe”. De me sentir culpada por querer ter um sono de qualidade.
O desmame é sempre um processo difícil, seja ele gentil ou abrupto, ele marca um novo ciclo no relacionamento entre mãe e filho. Desejar o desmame não deveria ser visto como um ato de “violência” contra os bebês. É um direito da mãe estabelecer um fim. Das amarras e obrigações que nos prendiam aos velhos padrões, nascem novas obrigações. A impossibilidade da negociação do corpo da mulher com o dever da maternidade agora só se fortalece com as novas demandas.
Maternar é estabelecer uma relação. Uma relação dialógica, um equilíbrio para que, se possível, todos fiquem bem. Nesses 14 meses, minha filha Cecília me ensinou que cartilhas podem escravizar, nos limitar e minar nossa autonomia e segurança como mães. Que não sou uma “super mãe” e nem tenho pretensão de ser. Eu sou uma mãe dentro dos meus limites como sujeito.
E nesses 14 meses eu cheguei no meu limite. O limite de olhar para a bebê e desejar fortemente que ela não peça o seio. O limite de não conseguir aguentar levar o dia por causa do cansaço das mamadas noturnas. O limite de desejar uma maternagem mais leve.
Acima de tudo, eu aprendi que tenho capacidade de cuidar e conduzir a educação dos meus filhos sem amarras ou aprovação de cartilhas. Toda informação disponível no mundo da maternagem é valiosa mas não pode ser dogmática. O importante é que tantos dados sejam orientadores, que auxiliem as mães a seguirem juntos com seus bebês respeitando seus limites.